Como estamos nos transformando na Terra dos Gigantes da Saúde?

Utilizo a expressão “Terra dos Gigantes da Saúde” por dois motivos distintos“

O primeiro se baseia em minha experiência pessoal na infância, na qual assistia a um seriado no qual seres humanos viviam aventuras em um mundo habitado por seres humanos gigantes, o que tornava a vida dos pequenos nada simples.  

O segundo motivo decorre da observação de que, nos dias atuais, há um aumento expressivo no número de instituições de saúde de grande porte no Brasil, o que pode ser atribuído a diversos fatores. 

Ao referir-me à “Terra dos Gigantes da Saúde”, quero provocar reflexões acerca das implicações da evolução genética do setor para pacientes e acompanhantes, tendo em vista o objetivo de buscar o melhor estado possível de bem-estar para esses indivíduos durante o atendimento médico.

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Fonte: Internet.

Na minha opinião, o adubo da Terra dos Gigantes da Saúde tem cinco ingredientes:

1. Empreendedorismo; 

Há uma longa lista de médicos e empreendedores que deveriam ser continuamente lembrados como transformadores. Embora o Fleury tenha sido fundado em 1926 pelo Dr. Gastão Fleury, foi nas décadas de 60 e 70 que ocorreram mudanças significativas na assistência a saúde. Nesse período, pessoas visionárias perceberam o potencial da saúde e sonharam com um padrão de atendimento superior ao oferecido pelos serviços públicos e filantrópicos. Assim, criaram redes de atendimento, como hospitais e centros de diagnósticos, e operadoras de planos de saúde, resultando na criação de marcas como Golden Cross, NotreDame Intermédica, UNIMED, AMIL e HAPVIDA.

2. Fee for Service; 

O INAMPS foi criado em 1977 pelo Governo para oferecer assistência médica e hospitalar a toda a população, mas não tinha uma rede de atendimento suficiente, então passou a contratar serviços de hospitais, centros de diagnóstico, reabilitação, etc. Os serviços eram pagos via contratos com modelo de remuneração baseado em tabelas de preço por procedimento, Fee for Service. Esse modelo não estabelecia regras claras para o controle de protocolos e avaliação para o DESFECHO do TRATAMENTO do paciente. Isso acabou levando as operadoras de planos de saúde privados, que estavam se espalhando pelo Brasil, a adotar os preços das tabelas como referência para negociação com seus prestadores de serviço.

3. Hiperinflação; 

O modelo de Fee for Service sempre foi baseado em Tabelas de Preços desde as primeiras Santas Casas do Brasil, mas sem regras claras para controle de protocolos e avaliação de desfecho. Nos anos 80, o Brasindice foi criado para corrigir preços de materiais e medicamentos devido à hiperinflação, mas não incluía honorários de médicos e preços de serviços de hospitais.

Isso desequilibrou ainda mais o modelo, levando gestores de serviços a majorar margens de venda e alguns médicos a estabelecer “relações comerciais” com distribuidores. Houve também fraudes com a apresentação de contas ao INAMPS e operadoras de planos de saúde com serviços não realizados, enquanto as operadoras lucravam aplicando as receitas no mercado financeiro e pagando fornecedores após 60 a 90 dias.

Esse cenário acelerou a “verticalização das operadoras de planos de saúde“, e todas passaram a construir suas próprias redes de atendimento com o lema de entregar o CUIDADO CERTO ao CUSTO CERTO. Infelizmente, nem sempre essa prática é adotada.

4. Capitalização da Medicina Suplementar via Gestores de Fundos de Investimento e depois IPOs; 

Durante os governos Lula e Dilma, houve uma abertura para o capital internacional tanto na propriedade de operadoras quanto na propriedade de redes de atendimento, o que acelerou a expansão das empresas aspirantes a gigantes.

5. A eterna espera por um novo modelo de remuneração substitua o Fee for Service. 

Todos os líderes da área da saúde sabem do diagnóstico e das soluções para corrigir os problemas do modelo de remuneração. Tenho orado para que esses líderes alcancem todo o seu potencial, parem de procrastinar e finalmente implementem a mudança no modelo de remuneração. Face do tsunami de custos e despesas na saúde, espero que minhas orações sejam ouvidas. 

Terra dos Gigantes da Saúde
Blurred background : Vintage filter patient waiting for see doctor.

Entre 55% e 60% das receitas de um hospital brasileiro vêm da revenda de materiais, medicamentos e órteses, próteses e materiais, devido ao atual modelo de remuneração Fee for Service e seus desequilíbrios de preços de diárias e taxas. Quando o zumbi Fee for Service morrer — e uma hora ele realmente morrerá — substituído por um modelo mais favorável à entrega do CUIDADO CERTO ao CUSTO CERTO, os Gigantes do setor estarão mais preparados do que os serviços de saúde de menor porte para reorganizar as margens – eles compram tudo em grande escala.

As salas de compras dos Gigantes são frequentadas por presidentes e diretores de fornecedores de tudo, desde materiais, medicamentos, órteses, próteses e materiais especiais até equipamentos médicos, ativos e sistemas de TI, peças e partes de reposição, mobiliário e até saches de chá e gravuras. O único inconveniente é, às vezes, ver profissionais de alto escalão, líderes premiados, saírem vermelhos e chorando.

Gigantes vão continuar crescendo.

A pandemia deixou o formigueiro bem barato: a maioria dos hospitais brasileiros tem menos de 100 leitos e estão localizados em cidades com menos de 200 mil habitantes. O “Fica em Casa” amedrontou os pacientes, os hospitais reduziram as atividades e se endividaram para permanecer abertos em 2020 e parte de 2021.

  • Rede Dor e o Mater Dei fizeram IPO em 2021. 
  • Rede Dor e a SUL AMERICA se uniram. 
  • DASA está se reorganizando, mas também está realizando aquisições. 
  • Hospital Care & Atlantica Hospitais e a Bradesco Saúde estão em negociação. 
  • A KORA, gestada pelo Fundo HIG, continua adquirindo empresas. 
  • Athena Saúde, gestada pelo Pátria, também continua realizando aquisições. 
  • Nelson Tanure comprou o controle da ALLIAR e espera lucrar com a venda para a DASA.
  • Oncoclínicas tem estabelecido acordos com UNIMEDS e Hospitais para a implantação de CANCER CENTERS e está adquirindo hospitais. 
  • O Sírio Libanês anunciou um plano para implantar 20 Centros de Atendimento Ambulatorial em regiões prósperas. 
  • O Einstein está sempre crescendo, e após consultoria de gestão, adquiriu um hospital em Goiânia. 
  • Fleury comprou a Pardini, está adquirindo clínicas de exames e buscando usuários sem planos de saúde. 
  • O BP São Paulo, Saúde Bradesco e Fleury se associaram na gestão do fluxo do cuidado do paciente com câncer. 

Os gigantes, após realizarem aquisições em praias e metrópoles, agora estão se movendo em direção a cidades de médio porte, mais afastadas do litoral.

Os pacientes e familiares estão se beneficiando com a transformação do território numa Terra de Gigantes da Saúde?

Os gigantes podem gerar grandes oportunidades de melhorias para os pacientes. Eles possuem muito mais recursos financeiros para investir em Tecnologia de Informação e acelerar a eficiência sistêmica dos processos. Além disso, conseguem enfrentar as maluquices da Judicialização com a força da grana e de advogados e seus Armanis. 

Outra possibilidade é a implantação de sistemas de capacitação, com conteúdos digitais e fluição ONLINE, em projetos transformadores do padrão geral de segurança e acolhimento que aceleram as mudanças para melhor. Por fim, os gigantes também podem levantar – e estão levantando – a régua da Gestão de Custos, que sempre foi um ponto frágil nas Organizações de Saúde.

Por outro lado, apesar dos discursos bonitos e planos estratégicos de entrega do CUIDADO CERTO ao CUSTO CERTO, os Gigantes têm desafios do seu tamanho: produzir atendimento com padrões homogêneos de segurança, acolhimento e custos não é fácil. E como dizia Peter Drucker: “culturas juntadas mastigam as estratégias no café da manhã”.

Mas e lá, na beira do leito, no box do PA, o Paciente está sendo melhor atendido nas casas dos Gigantes? Bem, na hora da verdade, são os Profissionais de Saúde, cada um deles (limpeza, enfermagem, medicina), que fazem a diferença para o paciente e acompanhantes.

Profissionais da Saúde são melhores nos Gigantes.

Escrito por Lauro Miquelin
CEO, Arquiteto, PhD Medical Building Design & Management, pai do Tomás e avô da Manoela.

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