Desafios na implementação de Tecnologias Digitais no atendimento ao cliente de Saúde.

Um ponto crucial a ser observado ao pensar nos desafios das tecnologias digitais deve ter relação com o benefício que gera ou o problema que resolve. Quando pensamos em atender melhor o cliente por meio das tecnologias digitais, temos obrigatoriamente que Empatizar antes de idealizar.

Empatizar trata de exercer a empatia ou seja, colocar-se no lugar do outro comportando-se ou pensando da mesma forma como ele pensaria ou agiria nas mesmas situações – olhando o mundo com seus olhos. Jamais podemos nos esquecer que o cliente de saúde tem inúmeras peculiaridades que devem ser antes entendidas para que se possa suprir ao mesmo tempo as suas expectativas sem prejuízo às suas necessidades – que ele próprio desconhece.

Minha vivência em todos esses anos, tem sido em programas que tenham como objetivo melhorar a experiência do paciente em contato com alguma jornada ou algum processo específico que demandam serviços. Junto da equipe da L+M por muitas trabalhamos detalhadamente quais seriam necessidades que afetam especificações, fluxos e processos internos, a maior parte, invisível aos olhos do cliente. Da mesma forma, as tecnologias que são pontos de contato com o cliente devem ser suportadas por backoffice que faça a gestão dos serviços ofertados e por middleware que possa ser utilizado de forma integrada, conectando demais aplicações de modo inteligente e eficiente com outras plataformas e sistemas que operam simultaneamente e olham para o processo inteiro e de forma sistêmica.

Na fase de criação de soluções, que seguramente irão se desenvolver ao longo da implantação, formular perguntas parece mais importantes de que ter todas as respostas. As perguntas certas nos dirigirão as respostas que precisamos e estas respostas é a matéria prima para aqueles que estão desenvolvendo uma nova tecnologia, não se limitem as barreiras políticas e processuais existentes – devem mudar a forma de abordagem ou de raciocínio sobre processos já consagrados e existentes nas Instituições de Saúde, para de fato, inovar.

Uma pergunta errada, irá gerar respostas erradas. Até mesmo incluir a resposta na pergunta costuma ser um erro clássico daqueles que buscam a inovação tecnológica para processos existentes nas rotinas hospitalares. Os processos irão moldar a tecnologia que está sendo desenvolvida e nunca o contrário. As soluções tecnológicas feitas sem esta interação poderão obrigar o usuário a ter que “trabalhar a mais” para atender a solução e não ser apoiada por ela.

Não faz sentido ter que inventar uma doença só para poder usar a “medicação” que acabamos de criar.
Os processos devem ser desenhados e mapeados por todos aqueles que participam como ponto de contato. Eles devem responder no passo a passo, a descrição das atividades idealizadas para o programa planejado em cada jornada.

Envolver o cliente (paciente, acompanhante, corpo clinico) é uma boa técnica para aumentar a nossa empatia com os contextos e situações que podem estar invisíveis no primeiro momento e para que possam ter mais elementos para compreender os processos. Temos usado diversos recursos nesta direção, como a Criação de Personas, o Storytelling, o Shadowing, o Cliente Oculto, o Mapa da Empatia, as Entrevistas Gemba e claro, o Foccus Group.

Seja qual for a técnica utilizada, a tecnologia irá promover eficiência ao evitar retrabalhos, gargalos ou morosidades. Para o cliente, antecipa alguma demanda, reduz burocracia e atua sobre o tempo de espera nos diversos processos e demandas. Não podemos jamais nos esquecer que as tecnologias digitais não irão resolver processos que estejam mal desenhados. A tecnologia pode inclusive acelerar um erro, caso o processo direcione de forma errada o fluxo ou o próximo movimento do mapeamento de atividades.

Percebo que muitas vezes, o item mais complexo de se lidar não está na tecnologia em si, mas no entendimento pleno de seu processo pelo seu gestor acarretando soluções diferentes das necessárias nas rotinas. Temos que constantemente nos perguntar se nossos processos atendem plenamente as necessidades dos clientes.

Atuo com a L+M como conteudista de diversas gamificações que desenvolvemos por meio de tecnologias digitais. Nosso maior desafio está justamente em garantir que o processo a ser gamificado seja o processo real e muitas vezes, neste momento se percebe que existem mais de um processo para se realizar a mesma atividade, sem padrão ou consistência.

A tecnologia pode nos ajudar em revisitar processos ampliando nossa visão do todo e permitir romper com o setorial e nos dar dimensões do “sem parede”, das conexões que ocorrerão nos pontos de encontro, da quebra dos silos corporativos, muitas vezes responsável por estagnar processos, inovação e crescimento.

Por que isso é importante para a Operação?

Já somos interagentes, interdependentes, transdisciplinares, intersetoriais usando ou não tecnologias. A integração de dados entre serviços é crucial para que cada processo gere conexões que se transformarão em interoperabilidade. A tecnologia poderá dar velocidade e consistência a conexões antes impossíveis. Cada vez mais frequentemente, iremos ouvir diálogos que até então pareciam, improváveis, exigindo novos modelos mentais:

Em uma reunião discutindo uma expansão e aumento da instituição, o gestor de Hotelaria diz: “preciso de um ponto de rede no DML para otimizar o setup do leito” E ouve a resposta do outro lado da mesa: “Não entendi…ponto de rede? Você quer dizer um ponto de água para abastecer o tanque e o diluidor do andar?”

Tecnologias que apoiam a área que afetam os clientes, normalmente atuam na redução dos tempos entre processos e como moeda de troca, ofertam maior eficiência nos processos, que invariavelmente desdobra em melhoria de serviços ao cliente, lá na ponta.

Por que isso é importante para a Arquitetura?

Projetar sem conhecer estas relações, no detalhe, poderá criar espaços ineficientes para a operação. Não prever a tecnologia prevista nos serviços fatalmente ensejará em maior necessidade de mão de obra, custos maiores, espaços que não abrigam a operação ou com formato que não atende suas reais necessidades.

IoT interliga equipamentos, podendo reduzir fluxos e substituir rotinas presenciais de forma remota. O RFID no enxoval pode diminuir o espaço da rouparia, um carrinho térmico pode reduzir o espaço da copa do andar ou até eliminar sua necessidade, novas tecnologias de desinfeção poderão reduzir o quadro, automatizar o quarto do paciente trará a ele maior autonomia. Mas sem um processo bem desenhado, alinhado por todos, explicado e desenhado por várias mãos, a tecnologia será vista pela equipe como algo a ser combatido e não apropriado em suas rotinas.

Em alguns casos, antes mesmo de terminar a frase sobre as vantagens que a tecnologia irá trazer, se ouve de resposta: “Mas quantas pessoas novas serão contratadas para operar este sistema? Nossa equipe não tem condições de fazer nenhuma atividade diferente das que já fazem… Ouvimos estas frases vindo de dentro do poço da reatividade. Recebem um estímulo e se comportam de forma automática e irracional esta resposta é uma resposta natural daquele que está inseguro com as mudanças, pois não foi envolvido, não participou e não se sente parte da mudança.

Mapear os stakeholders e envolvê-los (todos aqueles que possam influenciar qualquer etapa da jornada que está sendo desenvolvida) pode criar celeridade nos processos e evitar problemas na fase de aprovação.

Caso não participe do processo que ocasionará a mudança não irá reconhecê-la, não irá defendê-la, por melhor que esta tecnologia seja ou de fato, melhore a segurança ou a qualidade dos serviços prestados. Recomendo que sejam incluídos todos aqueles que participam dos processos de decisão assim como aqueles que mesmo excluídos deste processo, participam dele de alguma forma.

Afinal, como diria o poeta, todos querem mudanças, mas ninguém quer ser mudado.


Escrito por Marcelo Boeger.

Prof. Marcelo Boeger é Mestre em Planejamento Ambiental (UNIBERO) e Mestre em Gestão da Hospitalidade (ANHEMBI LAUREATE). Atua como sócio e consultor da Hospitallidade Consultoria. Coordena o comitê de FM em Serviços de Saúde da ABRAFAC, as regionais da Sociedade Brasileira de Hotelaria Hospitalar e o Grupo de Excelência do Conselho Regional de Administração de São Paulo e a Diretoria Técnica Científica da ABDEH. Professor do MBA de Gestão em Saúde e Controle de Infecção Hospitalar (CCIH-MED), de gestão em Saúde da Fundação Unimed e é coordenador e professor do curso de especialização em Hotelaria e Facilities do Hospital Albert Einstein e professor do MBA Executivo da FGV e da Fundação Dom Cabral.

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